Um novo Zeitgeist

O repensar das marcas neste novo mundo

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Introdução

Na 3ª edição do Gad’ Insights, investigamos como as marcas têm se comportado sob um novíssimo contexto que temos vivenciado, e geramos reflexões e recomendações que visam levantar a discussão sobre temas que julgamos relevantes para serem abordados agora.

Vamos falar do impacto da polarização de opiniões e de ideias na sociedade, do metaverso e do que ele vem a ser para as marcas, da necessidade de abordar a diversidade como uma nova mentalidade, da possibilidade (ou não) da longevidade das marcas, e ainda, e, novamente, de ESG.

Enfim, em um cenário de tanta transformação, o qual exige a atenção dos gestores de marca, construímos um material, a partir de uma curadoria feita pelo time de especialistas do Gad’, para apoiá-los na tarefa permanente de manterem suas marcas relevantes e preparadas para os desafios que se apresentam.

Boa leitura e reflexão!

Contexto

Nos últimos anos, pudemos constatar uma série de evidências reveladoras de que vivemos sob um novo momento caracterizado por transformações: no campo da tecnologia, no comportamento das pessoas, e na formação de novas culturas.

Um momento representado por um mundo híbrido, pela convivência de diferentes lados: o físico e o digital; o presencial e o virtual; o presente e o futuro; a busca pelo resultado financeiro, e a preservação ao meio ambiente. Enfim, um novo mundo com o qual as marcas devem lidar.

Um conjunto de aspectos que apontam para a constituição de algo que vai além de um novo tempo: um espírito – um novo Zeitgeist –, que já faz parte do nosso dia a dia, de fato, e que nos proporciona novas formas de consumo, entretenimento, informação, trabalho e relacionamento, abrindo uma série de desafios e de oportunidades para o mundo das marcas.

Tecnologia
Avanços tecnológicos mudam a forma de nos relacionarmos com pessoas e com marcas. Vivemos a omnicanalidade, o aumento do fluxo e da velocidade da informação: o protagonismo de algoritmos.
Comportamento
Uma sociedade mais consciente da condição do planeta, de seu bem-estar e de seu bem viver. Ainda, um boom digital, que potencializa as interações humanas, define novos comportamentos, e impacta nas escolhas.
Cultura
Época de incertezas e de ansiedades que reformata a sociedade:
a valorização da urgência e do ritmo acelerado; do novo e do efêmero; da diversidade, da aceitação e da inclusão; do debate, mas também da polarização.
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1. Um mundo polarizado

A polarização já está presente, há alguns anos, na sociedade, em várias partes do mundo e também no Brasil, conforme nos indica o estudo “Culture wars around the world”, conduzido pela Ipsos, que destaca que as altas tensões na sociedade brasileira têm sido geradas por meio de debates acalorados sobre temas como política, classes sociais, ideologia de valores e, até mesmo, de religião.

Na era das redes sociais, o palco dessas discussões se torna online, virtual – um lugar onde os polos de opinião acabam por buscar, constantemente, invalidar o lado oposto. Na última década, o processo de digitalização trouxe um alcance nunca antes visto para comunidades e para grupos sociais em todo o mundo; da mesma forma, criou oportunidades para as marcas, das locais e regionais às ditas globais, o que acabou por gerar uma demanda sobre seus posicionamentos, somada a uma expectativa sobre seus papéis na sociedade. Desta forma, a busca das marcas por relevância acabou por incluir, também, a definição de seu papel social e ambiental e de um posicionamento, por vezes inevitável, frente às pautas em voga atualmente.

E, se para atender isso não existe uma estratégia única, torna-se necessário expressar uma posição quanto a esses assuntos, conectando-se a uma realidade que vivemos no dia a dia, e, claro, estar sujeito às diferentes opiniões. No entanto, um fator permanece crucial para o discurso das marcas: a busca pela coerência através de suas atitudes e de suas práticas.

A resposta para isso sempre é a transparência. A quantidade de informação disponível e a velocidade de compartilhamento nas redes já torna o mundo bastante ou mais transparente hoje; dessa forma, as marcas devem falar de acordo com suas ações. E, claro, nunca é tarde para mudar: no caso de erros do passado ou de deslizes cometidos no presente, o reconhecimento do erro e um plano prático de correção têm ajudado as marcas a se manterem presentes, dialogando com seus públicos mesmo em um mundo polarizado. Então, o quanto a sua marca está realmente preparada para enfrentar e para lidar com serenidade com seus públicos e com as situações que irão se impor sob esse novo contexto?

  • Contra guerras, Mcdonald’s anuncia saída da Rússia
    Contra a invasão russa à Ucrânia, a rede de fast-food americana se posicionou anunciando a pausa de negócios e a saída do território russo após conflitos armados. Independentemente do prejuízo financeiro, a marca afirmou que o movimento da Rússia não é consistente com seus valores.
  • Boticário: “Amor é amor”
    Em campanha do “Dia do Amor”, Boticário reforçou posicionamento que vem trabalhando há anos em questões raciais e de orientação sexual. Na campanha, a marca traz o amor para o primeiro plano e mostra diferentes formas de amar.
  • Nike defende atleta e ideologia e sofre represália de parte do público
    Em 2018, a Nike apoiou Collin Kaepernick, atleta que protestou em oposição à violência policial contra negros, trazendo-o como protagonista de campanha da marca e defendendo o ato. Em represália imediata, parte do público da marca (polarizado) viralizou vídeos queimando artigos da mesma. No entanto, posteriormente a essa posição da marca, houve resultados positivos.

2. Fui cancelado,
     e agora?

Os avanços tecnológicos da última década nos trouxeram para um momento em que o fluxo de informações se tornou quase instantâneo. A alta velocidade de compartilhamento de fatos, dados, fotos e vídeos faz com que os mundos, físico e digital, ocorram de forma simultânea, híbrida. Esse cenário facilita a construção da denominada cultura de cancelamentos, e traz novos e grandes desafios de reputação para a gestão das marcas.

Como sabemos hoje, fatos e acontecimentos envolvendo o ambiente de uma marca e de seus colaboradores rapidamente repercutem; afinal, eles, involuntariamente, representam suas marcas. Uma gafe ocorrida em uma loja, um bug em um aplicativo, um vazamento de dados ou de uma declaração de um colaborador são viralizados rapidamente. Quando escalamos para as lideranças das empresas, essa representação e repercussão são ainda potencializadas. Como o jornalista e escritor Pedro Dória, ressaltou em debate sobre reputação, “cada vez mais as companhias têm sido percebidas pela imagem das pessoas que as lideram”. Vemos isso com a Tesla de Elon Musk, a Amazon de Jeff Bezos, e também na relação entre a Meta e Mark Zuckerberg.

O fato é que problemas de reputação podem ser gerados também por agentes externos, algumas vezes até fora do controle da empresa, mas que exigem uma postura atenta para mitigar os riscos. Pesquisas como as de saúde de marca ou de monitoramento de citações e de opiniões na mídia e nas redes sociais ajudam as empresas a obter em um termômetro de sua reputação.

Em casos mais notórios, de graves acontecimentos, as marcas não devem hesitar em tomar uma atitude corretiva e coerente com seu discurso. Muitas vezes, uma mudança de nome e de identidade pode não ser suficiente para a reconstrução da imagem de uma marca. Não se pode jogar o assunto para “debaixo do tapete”.

Não é o reconhecimento de um erro e a adoção de uma nova narrativa, então coerente e verdadeira, uma das respostas para o enfrentamento de uma crise de reputação?

  • Carrefour age em meio à crise reputacional
    Em resposta ao homicídio de um cidadão negro em uma de suas lojas (por parte dos seguranças da mesma) e à crise de reputação instaurada, o Grupo Carrefour anunciou a criação de um comitê de diversidade para a revisão de processos internos e um fundo para promover a inclusão social, além de iniciativas de combate ao racismo (como o debate “Diálogos que transformam”).
  • Facebook: Rebranding sem mudança
    Desde 2013, o Facebook vem tendo sua imagem abalada por falta de segurança da informação e por mau uso de dados dos usuários. Em meio à crise de reputação e com poucas respostas do grupo, o mesmo fez o rebranding de sua marca corporativa (que agora se chama Meta), trazendo um novo assunto para discussão, porém sem corrigir ou assumir os erros que cometeu.
  • Flow Podcast: Uma resposta rápida não evitou os danos de uma ação negativa
    Em fevereiro deste ano, o Flow Podcast prontamente agiu em resposta ao pronunciamento de seu apresentador, Bruno Aiub (o Monark), que defendia a existência de um partido nazista no Brasil. O Flow desligou o apresentador e fez nota de esclarecimento se desvinculando desses ideais. Mesmo assim, o podcast perdeu uma série de patrocinadores e de apoiadores.

3. Pessoas no centro,
mais do que nunca

O relacionamento entre as marcas e as pessoas foi impactado diretamente pelo crescente desenvolvimento de novas tecnologias. Neste novo zeitgeist sob o qual vivemos, observamos muitas marcas se apropriando de sistemas automatizados e de robôs para o relacionamento com o público. Nos últimos anos, vimos uma grande transformação no estilo de vida das pessoas e na forma como se relacionam. Dado o momento de insegurança e de isolamento social que vivemos recentemente, muitas pessoas de diferentes faixas etárias foram impactadas, e hoje sentem medo ou dificuldade de socializar e de retomar atividades presenciais.

Essa é a Síndrome da Gaiola, fenômeno notado por Gabriel Lopes, psiquiatra da Associação Brasileira de Psiquiatria, inspirado nos pássaros que não conseguem deixar seu cativeiro. Além disso, o estilo de vida das pessoas têm se tornado mais prático e conveniente: hoje, tornou-se comum fazer tudo em casa, como entretenimento, alimentação, consultas médicas, trabalho, educação, entre outros.

Nesse panorama, mais do que nunca, as marcas devem estar atentas às necessidades das pessoas, para serem capazes de proporcionar experiências e um relacionamento positivo. E, ainda assim, conseguir atender, de fato, sua demanda. Em momentos de fragilidade social, é importante ser “people centric”. “Know the user. Know the magic. Connect the two”, relata Paula Bellizia, ex-VP de marketing do Google para a América Latina e presidente da EBANX. Ou seja, conheça bem seu usuário, saiba o que você pode fazer por ele e saiba como conectar as duas coisas.

O desafio de relacionamento que surge para as marcas é o de não esquecerem de ser humanas. Empáticas. Devem saber utilizar a inteligência artificial da melhor forma e para seu benefício, mas não devem deixar de lado a busca pela qualidade da experiência para seu usuário. O relacionamento híbrido, que mescla a tecnologia com a dimensão humana, parece ser a solução ideal, ou a única possível, para otimizar tarefas, para potencializar as experiências e para ser efetivamente prestativo com os clientes e com as pessoas.

Afinal, com tantas tecnologias disruptivas, com novas formas de se relacionar e com tantas quebras de paradigma, até que ponto somos capazes de ouvir, de fato, nossos consumidores e clientes?

  • Mais do que uma atendente virtual, uma influenciadora
    A Lu do Magalu, hoje influenciadora e especialista digital, nasceu para humanizar a experiência de compra no e-commerce do Magazine Luiza e para levar mais proximidade aos seus públicos. A influência virtual da personagem começou com a sua própria humanização, trazendo sempre imagens que constroem sua história.
  • Netflix: a queridinha do público
    Uma das maiores plataformas de streaming, a Netflix, é um case de sucesso quando se trata da maneira com que a marca se relaciona com seu público. Apostando em uma comunicação inteligente, divertida e em uma linguagem cada vez mais próxima dos consumidores, ela interage com seu público nas redes sociais e usa trechos de filmes e de séries para gerar conteúdo cheio de referências, de memes e de falas comuns ao mercado local.
  • Nespresso Professional: uma experiência personalizada e exclusiva
    A Nespresso Professional, segmento responsável por soluções em café para B2B, expandiu seu relacionamento direto com clientes, buscando uniformizar os mesmos padrões de excelência e de qualidade de entrega característicos da empresa. A nova estrutura garantirá o relacionamento personalizado com a marca.

4. Metaverso: Obrigação
     ou oportunidade?

Recentemente, o tema do metaverso ganhou destaque pela ação de rebranding da marca corporativa do Facebook, que se tornou Meta, propondo um novo passo para as relações sociais via tecnologia. Por outro lado, sabemos que isso não é ou não seria uma novidade para as pessoas e para as marcas. Já há algum tempo, há diferentes indústrias construindo realidades virtuais e interativas para as pessoas, que é o caso da indústria gamer.

Como apontado pelo investigador de futuros Tiago Mattos, “o metaverso vem se aprimorando de forma rápida com o aumento do poder computacional, da capacidade e da velocidade da internet”. Hoje, as marcas já proporcionam novos tipos de experiências e de interações com seus públicos dentro de realidades virtuais, abrindo também um espaço enorme para o consumo virtual, como o de NFTs, por exemplo. Temos espaços híbridos de convivência no metaverso, entre o digital e o “não digital”. Em outras palavras, o metaverso hoje torna cada vez mais pessoal as interações e a convivência humana, agora em uma realidade estendida, digitalmente.

Nesse cenário, vemos muitas marcas adentrando em metaversos. No entanto, questionamos aqui se é uma obrigação elas estarem presentes nessas realidades virtuais. Os recursos computacionais necessários e a menor aderência a determinados mercados e a produtos torna esse “mundo” ainda distante para algumas marcas. Para outras, já nascidas com o poder tecnológico ou que acumulam essa capability há algum tempo, o metaverso se tornou uma nova oportunidade de geração de experiências.

Antes da geração de oportunidades e, assim, de resultados, o metaverso constitui um ambiente imersivo entre marcas e pessoas, com interações cada vez mais reais e potencialmente memoráveis, abrindo campo para novas vivências. Assim, surge a oportunidade para as marcas se tornarem mais relevantes e marcantes, construindo um valor intangível no processo de escolha e de identificação de marca. Agora, mesmo reconhecendo que o potencial máximo do metaverso e de suas interações ainda não está acessível, pois são necessários mais avanços computacionais e de rede, o fato é: já foi dada a largada nesse processo, provavelmente irreversível, e a decisão de fazer parte disso já está colocada na mesa. Junto a ela, a pergunta mais provável é: a hora de entrar é agora ou é melhor aguardar o “momento certo”?

  • Luxo no metaverso
    Dolce & Gabbana e Burberry são exemplos de algumas das marcas da moda de luxo que já entraram no metaverso. A primeira lançou a “Impossible Tiara”, produto digital à venda por US$300 mil, que só pode ser vestido no metaverso. Já a Burberry trouxe a “Pocket Bag”, uma bolsa em realidade aumentada, que o usuário pode personalizar e projetar sua imagem em qualquer ambiente com sua câmera.
  • Marcas propõem experiências e ativações no universo gamer

    • iFood chega ao Cidade Alta (modalidade do GTA V) e os gamers vivem a experiência do entregador para realizar missões.
    • Polo Ralph Lauren criou o Winter Escape, uma ativação dentro de game que permite atividades de patinação e a venda de roupas retrô.
    • Carrefour lança seu próprio mapa no Fortnite para estimular a alimentação saudável e o desenvolvimento sustentável.
  • Fashion Week no metaverso
    A Metaverse Fashion Week aconteceu pela primeira vez esse ano. Durante quatro dias, foi palco de uma série de passarelas virtuais, coquetéis, inaugurações de galerias e sets de DJs. Marcas como Perry Ellis, Dolce & Gabbana, Phillipp Plein e Tommy Hilfiger estiveram em destaque, todos promovendo suas próprias linhas de moda digital.
  • Reserva tem sucesso com venda de NFTs no metaverso
    Foi lançada a primeira coleção da ReservaX, setor de experimentação em produtos ligados ao metaverso. A coleção de 486 NFTs da marca se esgotou em apenas 12 horas e rendeu um faturamento de R$ 900 mil, equivalente a um mês de vendas em loja física.

5. Contar histórias &
     entregar valor 

O storytelling é uma prática muito comum no mundo das marcas. Em um cenário “multicanais” que vivemos, as marcas têm se esforçado para construir narrativas em uma série de pontos de contato diferentes, on – offline, buscando um envolvimento maior do seu público. Muitas delas têm se construído por meio de campanhas de comunicação, trazendo, assim, uma perspectiva de storytelling para esse processo. Mas será essa a melhor forma de criar valor, quando sabemos da necessidade anterior de se entregar uma proposta inerente à marca?

Marcas optam por “entregar”, de fato, em uma série de pontos de contato e não apenas por contar histórias, como é o caso do Mercado Livre, que passou por uma verticalização do negócio para, cada vez mais, controlar a experiência que é entregue. Stelleo Tolda, co-fundador do Mercado Livre, comentou sobre o assunto “ao assumir os meios e os processo de transporte e de entrega, os meios de pagamento e a resolução de problemas. Além de toda a interface de sua plataforma, a marca passou a ter maior controle da experiência proposta e entregue”. Assim, mais do que criar discursos em suas campanhas, o Mercado Livre consegue tangibilizá-las ao garantir consistência nas jornadas de pessoas e de clientes”.

O caso, como outros, é exemplo então de storydoing; ou seja, a marca se construindo e contando sua história por meio de suas práticas: a experiência de suas entregas. O fato é que fundações consistentes, coerentes e verdadeiras de marca direcionam outros diferentes aspectos das companhias, como seu produto, produção, ativações e contratação de novos colaboradores, ajudando a praticar uma história mais real.

Afinal, por quantas vezes definimos a história que queremos contar antes de garantir que a entrega de nossa proposta
de valor seja feita?

  • Mercado Livre: maior controle da experiência proposta e entregue
    O Mercado Livre verticalizou uma série de processos para cumprir tanto seu objetivo de “democratizar o comércio e os serviços financeiros, como o posicionamento de uma marca de rápida entrega. Com meios e processos de transporte e de pagamento próprios, além de sua plataforma tecnológica, o Mercado Livre consegue ter maior garantia e controle da entrega e da experiência de seus usuários.
  • Histórias contadas por marcas viram alvo de investigação
    As marcas Diletto e Do Bem viraram alvo de investigação do Conar, após denúncia alegando que as histórias contadas pelas marcas são exageradas e não correspondem à realidade. Os processos foram abertos para julgar se as marcas foram antiéticas com a criação de storytelling ficcionais.
  • Disney: Vivendo o Storytelling
    Um dos maiores exemplos de Storydoing é a Disney. Para ser a marca que entrega entretenimento às famílias por meio de histórias, a Disney, literalmente, traz à vida em resorts e em parques temáticos as experiências de seus filmes para que as pessoas possam vivê-las.

6. Tempos de
    diversidade

O tema Diversidade ganhou voz na última década e trouxe junto de si um grande impacto para o mundo das marcas.
E se antes ele permaneceu reprimido, com a crescente demanda em torno disso, tanto pela representatividade quanto pela acessibilidade, vemos agora isso começar a fazer parte das narrativas e dos modelos de negócio das marcas.

Olhando para as empresas, observamos aumentar gradativamente o movimento de formação de times mais diversos, com colaboradores de formações, etnias e vivências diferentes, complementando-se no ambiente de trabalho. Também percebemos marcas de diferentes indústrias buscando a diversidade em suas representações, como mulheres no mundo gamer, diferentes etnias e gêneros protagonizando heróis em filmes e o mundo fashion sendo representado por diferentes perfis, faixas etárias e tipos de corpos. Além da representatividade, o aprofundamento disso também pode ser demonstrado por meio da acessibilidade na comunicação da marca e até em seus produtos.

Marcas que não se atentam a essa demanda da sociedade podem colidir com essa nova necessidade e correr o risco de perder valor aos olhos de seu público. Contudo, é muito importante estudar como, de fato, a diversidade pode fortalecer e sustentar determinada marca: diferentes mercados exigem diferentes aspectos. Isso deve ser somado à realidade de cada marca e a tudo que irá trazer a coerência necessária para esse verdadeiro movimento.

Acima de tudo, torna-se fundamental que a diversidade seja um esforço legítimo da marca, refletindo diretrizes institucionais, e não caindo em tentação em ser um mero elemento estético da narrativa. E, para que não seja apenas parte de um “checklist”, e se banalize em um estereótipo disso, a diversidade deve ser praticada antes de ser comunicada; deve ser parte daquilo que sustenta a proposta da marca, uma reason to believe, de fato, mas não a própria proposta.

A mudança é importante, mas o quanto todas as marcas estão prontas e preparadas para essa mudança de mentalidade, de visão de mundo e de negócio no futuro? Isso deve preceder qualquer reflexão sobre a estratégia da marca.

  • Marvel aumenta a diversidade de seu universo
    Filmes, séries e produtos de entretenimento também buscam representação pela diversidade. As produções da Marvel, por exemplo, vêm trazendo, cada vez mais, protagonistas mulheres, de diferentes etnias (como negros, latinos e asiáticos), além da primeira super-heroína surda e de um herói gay em seu universo.
  • Abercrombie&Fitch no Netflix: Padrões de beleza
    Novo documentário da Netflix, Abercrombie & Fitch: Ascensão e Queda, conta a história e expõe os bastidores da marca fashion que, por meio de suas campanhas, cultura e declarações, ditavam um padrão de beleza e de corpo excludente. Com o tempo, a estratégia (muitas vezes preconceituosa) gerou problemas e fez aumentar a pressão por maior diversidade e representatividade na marca.
  • Reinvenção dos anjos
    A Victoria’s Secret teve de se ajustar aos padrões da diversidade, marca que era conhecida por suas modelos magras, brancas, altas e de cabelo liso. A falta de diversidade foi sentida pelo público, que reagiu negativamente pela falta de representatividade. Atualmente a marca trouxe mudanças, que vão desde a ampliação do portfólio de produtos até a comunicação com campanhas com mulheres de diferentes representatividades.
  • Heineken: Futebol para elas
    Heineken, patrocinadora da UEFA Champions League, reforçou seu movimento de inclusão no futebol recentemente. Com a assinatura “Um brinde a todos os fãs. Inclusive os homens”, a campanha veiculada na competição masculina questiona os estereótipos no futebol e anuncia também o patrocínio da marca às competições europeias femininas.

7. Para além do ESG

Não é novidade que o aumento da responsabilidade das marcas sobre seus compromissos vai além de atender seus objetivos de negócios. A Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima de 2021 (COP 26) foi palco para nações e também para organizações, incluindo as brasileiras Natura, BRF e Bradesco, entre outras, discutirem sobre como podem reduzir o impacto ambiental nos diferentes segmentos da economia.

Como já comentado na edição anterior do GAD Insights, o tema ESG entrou definitivamente na pauta de muitas organizações e de suas respectivas marcas, impactando as estratégias de diversos negócios. Desde então, o maior desafio das empresas tem se baseado em equacionar o binômio consciência – performance, propondo soluções que continuem sendo rentáveis para a empresa e para seus investidores, mas que garantam uma condição sustentável para o planeta e para o próprio negócio.

Sob esse contexto, a coerência na prática organizacional nunca foi tão importante. Ações ESG de caráter efetivo devem ser estimuladas e, claro, comunicadas pelas marcas, mas, antes de tudo, devem ser vistas como pontos de paridade, de responsabilidade e de legitimidade dentro do âmbito socioambiental, e não obrigatoriamente de diferenciação. Esse tema não deve ser o enfoque no exercício de posicionamento das marcas. O diferencial de uma marca segue sendo sua proposta de valor e sua essência, retratando a “razão de ser” daquele negócio e o que ela entrega para a sociedade. Dessa maneira, a mudança para um novo posicionamento de marca direcionado (ou mesmo viesado) pelo ESG pode soar “oportunista”, além de gerar incoerência com o próprio core business da organização.

Um rápido olhar sobre o vasto e heterogêneo universo das marcas nos faz questionar: será que não estamos confundindo estratégia de marca com estratégia de negócio e, assim, desvirtuando o real sentido e relevância do ESG?

  • Não é uma marca voltada ao ESG, mas uma estratégia de ESG à lente da marca
    O Grupo Boticário apresenta uma série de iniciativas visando mostrando governança e consciência de seu negócio, No entanto, todas as ações de ESG que a marca comunica são trazidas à lente de seu posicionamento, voltado a fazer beleza.
  • Lojas Renner é uma das empresas que melhor pratica o ESG, segundo B3, e tem posicionamento focado em seu core
    O grupo Lojas Renner foi listado em ranknig da B3 como a segunda empresa que melhor pratica o ESG no país, apresentando uma série de práticas, como trabalhos sociais com mulheres e uma cadeia de fornecimento responsável. No entanto, o posicionamento do grupo e de suas marcas segue sendo o de encantar as pessoas por meio da moda e do lifestyle, trazendo isso por meio dos produtos, da comunicação e da omnicanalidade.
  • (re)energisa pratica o ESG, mas explora a evolução energética em seu posicionamento
    O Grupo Energisa lançou, recentemente, a (re)energisa, negócio do grupo que traz um ecossistema de soluções de energia para o mercado. Com veia sustentável e uma frente ampla de geração de energia limpa, a (re)energisa não se posiciona exclusivamente sobre o tema ESG: a marca traz a “energia em evolução”. Isto é, explora um posicionamento voltado à inovação do setor e à eficiência energética, que pode proporcionar ao mercado.

8. Reendobranding

Nos últimos anos, as pessoas e as empresas tiveram que repensar seus formatos de trabalho. A discussão entre o remoto e o presencial aqueceu o mundo corporativo, tendo um impacto direto no dia a dia dos colaboradores, levantando também um desafio cultural e de marca dentro das empresas.

A construção de uma marca valiosa requer uma cultura ativa e viva dentro da companhia. No entanto, as recentes mudanças no modelo de trabalho têm sugerido uma evolução cultural para as empresas; demandando uma maior, ou mesmo uma outra, atenção às necessidades dos colaboradores, que hoje já se acostumaram a uma maior flexibilidade em seu estilo de vida. Falamos, então, de um contexto interno da organização, em que a própria noção de clima organizacional deve ser repensada.

Essa adaptação passa também pela ressignificação dos escritórios e dos espaços físicos, que deram lugar a ambientes voltados para o encontro, criação, conexão e integração entre os times que passaram a trabalhar remotamente. Além disso, a atenção sobre a saúde e bem-estar do colaborador ganhou espaço, e as marcas, cada vez mais, vêm incorporando, conscientemente, este aspecto cultural. Neste novo formato
de trabalho, iniciativas antes desejáveis e extraordinárias, como aulas de yoga, de mindfulness e de acompanhamento psicológico, passam agora a fazer parte da rotina de tantas empresas.

Dessa forma, um novo desafio se apresenta: como redefinir suas marcas “para dentro” – alterando, de forma mais efetiva, a mentalidade e as atitudes do colaborador sob esse novo contexto? É necessário tornar a proposta de valor da marca mais presente e atuante nos seus ambientes de trabalho; lembrando que estes incluem, hoje, muitas vezes, a própria casa do colaborador. Ou seja, se construir marcas para dentro é ainda falar de endobranding – de promover em cada um os valores da marca e da organização – , agora, mais ainda, é falar de gerar o tão desejado engajamento em torno deles, capaz de impactar e de transformar suas atitudes e comportamentos, independentemente de se estar, ou não, dentro do escritório, da fábrica, ou de qualquer outro espaço da empresa.

  • BASF cria Movimento Estar-Bem
    Uma das ações implementadas pela BASF para promover a saúde e o bem-estar de seus colaboradores foi o Programa Estar-Bem, implementado em 2020. A iniciativa oferece aulas on-line de yoga e mindfulness, palestras com especialistas, além de programação para as famílias.
  • Kraft Heinz cria programas para apoiar saúde mental dos colaboradores
    A Kraft Heinz diversificou e ampliou suas ações para garantir o bem-estar e a saúde mental dos funcionários com o “Programa Viva Bem” e o projeto “Delicious Friday Festival’’, oferecendo assistência psicológica aos colaboradores.
  • Energisa e sua política de trabalho híbrido
    Visando melhorar a qualidade do trabalho híbrido, o Grupo Energisa lançou a iniciativa “Lá & Cá”. Com ajuda da tecnologia e das ferramentas analytics, o programa busca promover segurança, saúde e bem-estar para o dia a dia do colaborador, além de performance para seu trabalho.

9. Forever Branding

Os avanços tecnológicos que ajudam a evidenciar que vivemos sob um novo Zeitgeist determinam um novo ritmo no cotidiano das pessoas. Vivemos tempos mais rápidos, sendo acostumados a uma “lógica digital”, que emerge o instantâneo e o veloz ao nosso consciente.

Os últimos anos atuaram como catalisadores desse fato. Com aspirações e desejos mais imediatos, passamos a ter a velocidade como um de nossos critérios de satisfação, como Victor Stirnimann, terapeuta, professor e consultor, já pontuou:

“Com novas necessidades e mais consciente, essa sociedade, mais ‘volátil’, cria expectativas em relação às marcas, que, por vezes, também se transformam constantemente”.

Esse novo cenário trouxe uma série de marcas em “estado beta” frequente, isto é, negócios e marcas constantemente se ressignificando, trazendo novos posicionamentos ou pivotando, e isso levanta o questionamento se o olhar de longo prazo das marcas ainda faz sentido.

Historicamente, vimos marcas se “perpetuando” ao praticar um mesmo posicionamento por longos períodos. A indústria da moda é um exemplo disso. Nos apresentam marcas centenárias que, mesmo se modernizando, praticaram suas propostas de valor de forma longeva. Estamos em um cenário em que marcas “perpétuas” convivem com marcas “mutantes” e, desta forma, deveríamos nos perguntar: devemos tratar as marcas de forma efêmera?

  • Nubank muda marca com crescimento do portfólio
    Sempre atento à reinvenção, o Nubank apresentou um rebranding em 2021, poucos anos após seu nascimento, mesmo com saúde de marca bastante positiva. As mudanças foram consequência do crescimento do portfólio de produtos e da maturidade da empresa: o que era uma marca de cartão de crédito, se tornou uma plataforma de soluções financeiras.
  • Gigantes obsoletos

    • Blockbuster foi a maior rede de locadoras de filmes, séries e videogames no mundo, mas sucumbiu diante dos serviços de streaming.
    • BlackBerry foi responsável pelo início do mercado de tablets e celulares. Porém não considerou a experiência do usuário e com a chegada de novos concorrentes em 2017 deixou o mercado de smartphones.
    • Kodak tinha presença global e era uma referência no mercado da fotografia. Foi responsável por revolucionar o mercado de filmes fotográficos, mas não se manteve próxima aos avanços de tecnologia e foi à falência.
  • Lojas Americanas: décadas de reinvenção por um varejo híbrido
    Respondendo aos avanços tecnológicos e às mudanças de comportamento do público, a Americanas saiu de um posicionamento de preço baixo para um posicionamento de omnicalidade. Isso por conta da transformação dessa marca centenária, que se reinventou trazendo canais digitais de venda, novos serviços e novas marcas, como a Americanas.com, Ame, Americanas Local e Americanas Marketplace.
  • Gucci: centenária e agora virtual
    A grife lançou a submarca Gucci Vault, seu canal para apresentar coleções em constante mudança de diferentes estilos, desde coleções limitadas vintage até as mais modernas. Essa plataforma também reúne todas as iniciativas da Gucci ligadas ao metaverso, como NFTs e experiências em realidade virtual. Por meio do Vault, a Gucci liga a tradição ao presente e futuro.
  • A centenária Selfridges mostra como se manter relevante no varejo físico
    A loja de departamentos é outro exemplo de marca tradicional que segue sendo relevante. A primeira loja foi aberta em 1909, mas sempre pareceu estar à frente do seu tempo: o ambiente é projetado para além do consumo, é um espaço para as marcas projetarem novas experiências para o público.

10. Tempos híbridos

Vivemos novos tempos, pois algo essencialmente novo já se apresenta aos nossos olhos, mas ainda convivemos com o “velho”, aquele que, por vezes, insiste em permanecer. Vivemos em tempos de transição, nos quais testemunhamos a convivência entre “diferentes” nas variadas dimensões do nosso cotidiano; um cenário ilustrado por novos hábitos de vida e de consumo, ou mesmo pela atualização do que já existia anteriormente. Tempos híbridos, que incubam novidades e que reciclam antiguidades.

Tantas marcas já se atentaram a esses tempos mutantes, pois é nesse continuum, onde e quando, que novas oportunidades de geração de valor surgem. Novos territórios, onde as marcas podem se enveredar em busca da necessária relevância; um outro mundo recém-constituído, ou ainda em construção, que agora deixa de ser plano de fundo para se tornar proposta e questão, colocadas na mesa para diálogo, reflexão e maior conexão, com cada um de seus públicos: o cliente, o indivíduo, o cidadão, a instituição e a sociedade.

Cabe então às marcas mergulhar e respirar fundo nessa nova realidade, em que não existe certo ou errado, ou, pelo menos, esta não está ainda tão clara e evidente; cabe a cada marca compreender o que faz mais sentido para si, de acordo com seu propósito, sua visão de futuro e as necessidades de suas audiências; cabe então expressar isso eticamente, esteticamente, e ativamente.

Como fazer isso, de forma coerente e consistente, em um contexto de redefinição (ou de indefinição mesmo), feito de tantos “Admiráveis Mundos Novos’’, identificando oportunidades de liderar um movimento que transforma ambientes e mercados, mas, inevitavelmente, transforma, ao mesmo tempo, a todos nós e nossas marcas?

  • Itaú e sua constante atualização
    O Itaú é uma marca que tem buscado sinalizar ao espírito da sua época, seja pelo engajamento em cultura, empreendedorismo, educação e mobilidade urbana (com as bikes e o vec Itaú), e tantas vezes tem extrapolado seu core de atuação. Acima de tudo, a marca tem buscado acompanhar as evoluções tecnológicas, sendo um dos primeiros bancos a proporcionar uma jornada digital aos correntistas. Recentemente, lançou os bancos digitais Iti e até o Players Bank, um banco com condições especiais para o público de gamers.
  • Hospital Albert Einstein une a inovação à responsabilidade social
    Inovação é o meio para ser responsável com a população. Sendo uma das marcas mais inovadoras do setor, o Hospital Albert Einstein trouxe o “open innovation” para o segmento com a Eretz (incubadora de startups) e um laboratório de inovação e de capacitação, desenvolvendo novas metodologias e tecnologias para a saúde. Digitalizando jornadas, foi pioneira também em oferecer a telemedicina no Brasil, facilitando o atendimento. Filantrópica, apresenta uma série de parcerias com o governo para democratizar a saúde, gerindo UPAs, UBSs, ambulatórios e hospitais municipais. E, atenta à era das redes sociais, é uma marca que gera conteúdo preventivo constantemente ao público.

Conclusão

Um novo Zeitgeist

Se um novo cenário de mercado já nos levaria a um repensar das estratégias de negócio, e portanto de marca, o que podemos dizer disso sob um contexto atual, onde a mudança se dá no modo em que fundamentamos nossas ações e decisões, nos âmbitos cultural, social e intelectual?

As importantes transformações que passam à nossa frente, traduzidas em um novo Zeitgeist, nos obrigam a encarar e a revisar de forma corajosa a abordagem que temos dado à construção de nossas marcas e de suas respectivas experiências. Nós do Gad’ acreditamos na necessidade de se repensar a estratégia da marca tomando-se em consideração
novas atitudes e proposições que deem conta das expectativas e das necessidades de nossas audiências que têm sido redefinidas dia após dia.

Neste sentido, acreditamos na necessidade de se conceber novas estratégias, fundadas em novos paradigmas. Tudo isso, a partir de um outro olhar para o todo, que contemple suas dimensões física e digital, capaz de redefinir prioridades, reorganizar narrativas e provocar o diálogo, além de outros interrelacionamentos e experiências.

Estamos prontos? Sim, para construirmos juntos de nossos públicos, internos e externos, durante nossa caminhada daqui para o futuro, as experiências capazes de nos conectar a este novíssimo tempo que esboçamos em cada um desses insights.

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